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Menos - Sinônimo de mais

 

Denise Rodrigues do Amaral
denis90@ibm.net

 

     A natureza segue seus ciclos, e o mesmo fazemos nós. Depois da tempestade vem a calmaria, e as pessoas também procuram um período de tranqüilidade após um período especialmente estressante de suas vidas.

     A geração yuppie foi marcada pelo consumo excessivo, pela criação de infinitas necessidades. Ter um produto que não fosse de griffe era o mesmo que não ter, e a vaidade reinou suprema.

     O desejo de impressionar era tão forte que fazia calar a verdade que estava dentro de cada um de nós. Até mesmo aqueles que não tinham tantas posses eram levados pela onda do momento, de forma que todo e qualquer recurso era utilizado em nome da ostentação.

     Mas a natureza humana, mais cedo ou mais tarde, sempre se rebela contra esses movimentos - em palavras simples, as pessoas se cansam do trabalho exaustivo de ter que manter uma aparência que não reflete a realidade de seu interior.

     As pessoas se cansam de representar, e se afastam um pouco, para que possam recuperar sua própria identidade.

     Ter demais já não significa tanto, já que o "demais" nunca parece suficiente.

     Quanto mais se compra mais se quer comprar, mesmo que não tenhamos tempo ou oportunidade de usufruir de fato de tudo aquilo que acumulamos.

     Na verdade, quando a quantidade excede muito a necessidade, nem sequer nos lembramos de tudo o que temos. Quando nos damos conta de que só utilizamos realmente uma parte de tudo o que possuímos, e de que perdemos tempo demais fazendo coisas que não queremos apenas para impressionar pessoas de que não gostamos, descobrimos um grande atrativo na simplicidade.

     Mas a simplicidade, aqui, está de mãos dadas com a qualidade. Aliás, é este exatamente o ponto - melhor qualidade de vida, através de recursos mais simples, mais digeríveis, mais facilmente controláveis.

     A velocidade da vida - tudo mudando tanto, e cada vez mais depressa! - nos manda mensagens muito claras. O tempo é um bem precioso e muito escasso. É preciso aproveitá-lo da melhor forma possível. É preciso utilizá-lo, tanto quanto pudermos, naquilo que sabemos ser realmente importante.

     Olhamos para trás - o que fizemos, até agora, com as nossas vidas?

     Para onde direcionamos os nossos esforços, e com que finalidade?

     Onde aplicamos os nossos talentos, que fizemos com nossos dons? Depois do susto, somos movidos pela urgência de mandar as aparências para o espaço, e de adaptar nossas necessidades materiais e concretas a um estilo de vida que nos aproxime daqueles que amamos, e que nos permita fechar os olhos, à noite, sabendo que durante o dia fizemos algum bem.

     A simplicidade deve estar sempre aliada à sabedoria, para que não nos escravize. A idéia é justamente libertar-se das necessidades puramente aparentes para que possamos atender melhor as nossas necessidades reais. A qualidade acima da quantidade.

     Quando nos transportamos da superfície à essência, descobrimos prazeres como compartilhar o tempo com pessoas de quem gostamos, em atividades que nos agradam.

     Muito diferente - e infinitamente mais compensador - do que desperdiçar horas nas filas sofisticadas da cidade, onde ver e ser visto é a finalidade principal.

     Brincar com os filhos pode não impressionar tanto quanto ter reuniões com políticos importantes ou empresários poderosos - mas quem será capaz de dar mais amor? E quando a idade avançar um pouco, quais serão as lembranças mais gostosas, as imagens mais queridas?

     Será tão gratificante ser reconhecido na rua por estranhos, a ponto de não importar o fato de você tornar-se um estranho dentro de sua própria casa?

     Nos Estados Unidos, esta volta à simplicidade - downshifting - é um fenômeno já mensurado por pesquisas, mostrando que um número significativo de pessoas optou por uma vida mais equilibrada, menos estressante, para ter mais tempo livre, para passar com os filhos ou para realizar atividades pessoalmente mais compensadoras.

     A vida passa tão depressa, que não podemos perder tempo com as aparências. Nossa capacidade de amar e de criar é tanta, que não podemos nos dar ao luxo de deixá-la sempre para amanhã ou para depois, sob pena de a desperdiçarmos completamente.

     Sempre que tivermos que optar, devemos olhar para dentro de nós mesmos, e escolher de acordo. No final das contas, é conosco que temos que conviver, e não com todos aqueles olhos anônimos que nos invejam ou nos admiram.

     É a nossa sede interior que deve ser saciada, e não a deles. Polimos tanto a lataria, que nem temos tempo de perceber que o motor não vai indo bem.

     É melhor dar uma parada, desacelerar um pouco, fazer os ajustes necessários e seguir caminho, desta vez admirando a paisagem, e até parando um pouco em cada lugar que nos agradar.

     Ou corremos o risco de pifar, de repente, sem nem mesmo ter idéia de onde estamos, ou do que fazemos ali.