Home | Novidades Revistas Nossos Livros  Links Amigos

Luz e Sombra

 

Antonio Carli

 

Reencontro do Paraíso

(excerto do livro Luz e Sombra - em elaboração)

 

Cortar o cordão umbilical é um ato simbólico, os filhos nunca se separam das mães ainda vivas, por mais adultos que estejam, e, se porventura houver vida após a morte, então a ponte continuará entre os dois mundos ou no outro mundo.

Quando o filho sofre, a mãe sofre, mas ela preferiria sofrer em dobro e poupar o filho.

Também foi um ato simbólico, a expulsão de Adão e Eva do Jardim do Édem.

Aquele amarelo que vai gradativamente tornando-se rosado e de rosado para um marrom avermelhado, na casca da manga; a esfera negra, brilhante, de suave doçura, a jabuticaba, nos faz lembrar que o Édem continua aqui.

Adão e Eva continuam no paraíso mas não sabem.

Tudo não passou de um mal-entendido, na verdade o casal original foi vítima da maldade da cobra:

A serpente,

Rastejante,

Inclemente,

Sibilante,

Maledicente,

Insinuante,

Tomada pelo pecado da inveja,

Pôs-se a instilar nos ouvidos de Eva

O veneno da intriga.

Iludida,

Eva comeu da árvore do conhecimento,

E conheceu o sofrimento,

Conheceu a danação,

A menopausa, a menstruação.

Ela conheceu a dor da parição.

Seus filhos, Abel assassinado.

Caim assassino.

Iludiu Adão e o tornou infeliz e cúmplice.   

Ele que era feliz, como um índio feliz, em cujos ouvidos jamais foram pronunciadas as palavras riqueza e pobreza, descobriu que era pobre.

Seus olhos já não viam e o Jardim perdeu o brilho, o perfume.

Riqueza e pobreza não constavam de seu dicionário.

Agora que se achava pobre, Ele perdeu a alegria. 

O muro que cercava o jardim era alto, porém munidos de paus e pedras o escalaram. Eva, muito afoita, foi na frente e ficou sobre o muro chamando: “Adão, Adão!   Suba aqui, cuidado para não cair.”

Agora o espanto,

O encanto.

Além muro, Eva viu uma visão infernal:

Carrões,

Aviões.

Miríades de bugigangas nos quintais dos capitalistas.

Mas, como conhecia o ser humano e o barro de que foi criado, e vendo Adão arredio, o Senhor chamava:

“Adão, Adããão!

Onde estás que não respondes?

Em que beco, em que moita tu te escondes?”

Deveria comparecer de tanga? Uma vergonha!

O Senhor está chamando e Ele não tem um terno de casimira inglesa.

Eva, outrora tão doce,

Agora ao seu lado,

Olhar esbugalhado,

A reivindicar vestido de seda.

Eva conheceu a pobreza de Adão.

Este conheceu a ambição.

O Senhor conheceu Adão.

Adão não era comunista.

Adão era consumista.

O Senhor derrubou o muro e expulsou a ambos, dizendo:

“Saiam daqui! Vão procurar emprego!”

Desde então, Eva vagueia pelas ruas olhando vitrines.

Adão vagueia pelas vias, procurando emprego.

Cabeças quentes no inferno.

Corpos frios no Paraíso.

 

O lobo e o cordeiro

(excerto do livro Luz e Sombra - em elaboração)

 

Um homem estava sentado num cepo à beira da estrada, ao redor dele uma multidão de crianças ali estava para ouvi-lo. A certa distância, pela estrada, estava vindo um grupo de homens barbudos, vestidos em seus roupões antigos, calçando sandálias e cobertos de pó.

Enquanto o homem do cepo aguardava que as crianças se aquietassem e se sentassem no chão, o grupo de caminhantes chegava e, vendo aquela aglomeração, parou para ver e ouvir.

 

O homem sentado no cepo iniciou sua fala fazendo admoestação:

-  Crianças, fiquem longe dos homens malvados e poderosos. Eles sempre têm razão. Prestem atenção na história que vou contar:

Era uma vez um lobo e um cordeiro, que foram beber água na margem de um mesmo rio .............................................................................................................. ..........................................................................................................................................

............., então, disse o lobo, se não foste tu, foi teu pai ou teu tio, assim dizendo devorou o cordeiro.

As crianças, silenciosas e admiradas, e lembrando-se da admoestação inicial, entenderam o ensinamento contido na história.

O grupo de homens, ali parado e em pé, também ficou, alguns admirados, outros embasbacados, outros ainda estupidificados com a habilidade do contador de histórias.  

Então, aquele que parecia ser o líder dos caminhantes, adiantou-se e tomou a palavra, dirigindo-se ao contador de histórias, nestes termos:

-  Levanta-te e segue-me, farei de ti meu assistente.

Senhor, nada sei a respeito do reino dos céus. Nem sequer sei pescar, replicou La Fontaine.

-  Não sabes mas aprenderás. Tu ensinas por fábulas, Eu ensino por parábolas. Nossos métodos são semelhantes, treplicou o Mestre.