o curso que se pode discorrer não é o eterno curso
o nome que se pode nomear não é o eterno nome
imanifesto nomeia a origem do céu e da terra
manifesto nomeia a mãe das dez-mil-coisas
portanto
no imanifesto se contempla seu deslumbramento
no manifesto se contempla seu delineamento
ambos... o mesmo saindo com nomes diversos
o mesmo diz-se mistério
mistério que se renova no mistério...
porta de todo deslumbramento
sob o céu
conhecer-se o que faz o belo belo eis o feio!
conhecer-se o que faz o bom bom eis o não bom!
portanto
o imanifesto e o manifesto consurgem
o fácil e o difícil confluem
o longo e o curto condizem
o alto e o baixo convergem
o som e a voz concordam
o anverso e o reverso coincidem
por isso
o homem santo cumpre os atos sem atuar
pratica a doutrina sem falar
as dez mil coisas operam sem serem impedidas
nascem sem serem possuídas
atuam sem serem dominadas
concluida a obra ele não se atém
e só por não se ater ela não se esvai
não primando os bons o povo não compete
não prezando bens custosos o povo não aladroa
não exibindo o desejável seu coração não erra
por isso o governo do homem santo
esvazia os corações
sacia as entranhas
enfraquece as vontades
vigora os ossos
nunca deixa o povo com saber e desejos
não deixa o sábio ousar atuar
atuando o não-atuar então não há desgoverno
o curso é um vaso vazio
o uso nunca o replena
abismal!
parece o progenitor das dez mil coisas
abranda o cume
desfaz o emaranhado
harmoniza a luz
congloba o pó
profundo!
parece algo lá existir
eu não sei de quem é filho
afigura-se o anterior do ancestral
o céu e a terra são sem amor-humano
consideram as dez-mil-coisas cães-de-palha
o homem santo é sem amor-humano
considera as dez-mil-coisas cães-de-palha
o vão entre o céu e a terra...
como se parece a um fole!
mas esvazia-se sem se contrair
move-se e ainda extravasa!
muitas palavras e números o limitam
melhor guardá-lo no íntimo
o espírito do vale não morre
diz-se místico feminino
a porta do místico feminino
diz-se raiz do céu e da terra
suave e multíflua
parece lá existir
contudo opera fio a fio
o céu dura a terra perdura
céu e terra duram que duram
por não viverem para si
eis porque podem viver eternamente
por isso o homem santo
ficando atrás sobressai
ficando fora persiste
não será por não ter nada seu ?
pode pois realizar o que é seu
o bem supremo é como água
água... apura as dez-mil-coisas sem disputa
habita onde os homens abominam
por isso abeira-se ao curso
morar bom é onde
coração bom é profundidade
doar bom é amor
falar bom é sinceridade
governo bom é ordem
serviço bom é capacidade
movimento bom é quando
eis que só sem disputa não há oposição
manter saturando melhor cessar
seguir aguçando não vai durar
sala cheia de ouro e jade não se pode guardar
enfatuar-se com bens e fama por si já dana
concluida a obra abster-se
eis o curso do céu
conseguir:
a alma e o espírito num amplexo inseparável!
regular o sopro maleável como no recém-nascido
polir o espelho místico até ficar sem mácula!
amar a nação e reger o povo sem atuar!
no vaivém da porta do céu atuar qual mãe-pássaro!
ser iluminado nos quatro quadrantes sem ter saber!
gerar e criar
gerar sem possuir
atuar sem depender
presidir sem controlar
isto diz-se virtude mística
trinta raios perfazem o meão
no imanifesto o uso do carro
barro moldado faz o jarro
no imanifesto o uso do jarro
talham-se portas e janelas para a casa
no imanifesto o uso da casa
portanto
utilizando-se o manifesto útil fica o imanifesto
as cinco cores cegam a visão do homem
os cinco tons ensurdecem a audição do homem
os cinco sabores embotam o paladar do homem
galopes e caçadas frenesiam o coração do homem
bens custosos obstam as ações do homem
por isso o homem santo
sendo entranhas não olhos
afasta o ali agarra o aqui
honra e desonra são como o corcel em fuga
avalie grandes aflições como o corpo
porque se diz:
honra e desonra são como o corcel em fuga
a honra eleva a desonra abate
ganhar esta perder aquela é assustador
por isso se diz:
honra e desonra são como o corcel em fuga
porque se diz:
avalie grandes aflições como o corpo
eu tenho grandes aflições por ter corpo
sem corpo que aflições teria ?
portanto
quem avalia o mundo como o corpo
este pode ter missão no mundo
quem ama o mundo como o corpo
este pode ter cargo no mundo
ao olhá-lo não se vê o nome soa yi
ao escutá-lo não se ouve o nome soa xi
ao tocá-lo não se obtém o nome soa wei
estes três não se podem decompor
portanto entremeados constituem um
seu alto não se alumbra
seu baixo não se assombra
contínuo contínuo... sem se poder nomear
retorna a não-coisa
isto se diz: forma do não-forma
imagem do não-coisa
isto se diz: claroescurecer
ao defrontá-lo não se vê o rosto
ao seguí-lo não se vê o verso
reintegrando-se ao curso da antiguidade
pode-se reger o presente
poder conhecer a origem da antiguidade
isto se diz: o desemaranhar do curso
na antiguidade os que bem atuavam o curso:
sutilmente sublimes misticamente penetrantes
tão profundos que não podiam ser conhecidos
e só porque incognoscíveis força-se configurá-los
cautelosos! como a transpor águas hibernais
vacilantes! como a temer vizinhos dos quatro cantos
reverentes! como hóspedes
evanescentes! como gelo a derreter
genuínos! como lenho tosco
abertos! como o vale
opacos! como a água turva
quem pode pelo repouso aos poucos clarear o turvo ?
quem pode pelo movimento aos poucos avivar a paz ?
quem guarda este curso não quer ficar pleno
e só por não ficar pleno pode recôndito renovar-se
atingindo o vazio extremo
conservar-se firme no repouso
as dez-mil-coisas confluindo
eu assim as contemplo no refluxo:
eis que as coisas no florescimento
retornam uma a uma à raiz
o retorno à raiz soa: repouso
isto se diz: retornar ao destino
o retorno ao destino soa: eternidade
conhecer a eternidade soa: alumbramento
não conhecer a eternidade é tresloucar no azar
conhecer a eternidade é englobante
englobamento então justiça
justiça então mediação
mediação então céu
céu então curso
curso então duração
dissolvendo-se o corpo não periga
a alta antiguidade não conhecia os regentes
tempos depois eram amados e louvados
tempos depois foram temidos
tempos depois são vilipendiados
estes de pouca fé não merecem fé
pensativos!
aqueles sim pesavam as palavras
concluída a obra as coisas decorriam
as cem famílias juntas diziam:
por nós somos o que somos
o grande curso reflui...
surge amor humano e justiça
sabedoria e crítica afluem...
surge a grande hipocrisia
os vínculos familiares discordam...
surgem os deveres filiais e paternais
nações e familias no caos...
surgem os ministros leais
não à santidade fora a sabedoria
o povo é cem vezes favorecido
não ao amor humano fora a justiça
o povo volta a ser filial e paternal
não ao engenho fora o ganho
não há roubos não há assaltos
estas três sentenças são ornamentos
ornamentos não suficientes
deve vigorar pois esta regência:
mostrar-se como seda natural
abraçar o lenho tosco
diminuir seus interesses
diluir suas paixões
não ao estudo e foi-se a inquietação
"sim" e "pois não" quanto se distinguem?
bem e mal como se distinguem?
o que os homens temem não se pode não temer?
estéril! esse nem sim nem não
A massa efusiva e mais efusiva
como no gozo de um festim sacro
como nos altos a sagrar a primavera
só eu ancorado! nesse ainda sem auspícios...
como recém-nascido antes de se acriançar
marionete! sem para onde retornar
a massa tem o supérfluo
só eu sem quê nem para quê
eu... que coração de idiota
oh! confuso e mais confuso
a gente brilha que brilha
só eu ofuscado e aparvalhado
a gente vibra que vibra
só eu melancólico e mais melancólico
plácido! tal qual o mar
ao vento! como sem lugar
a massa tem com quê
só eu obstinado e tosco
mas só eu diferente dos outros
dignificando a mãe nutriente
os traços da grande virtude só provêm do curso
o curso feito coisa... tão ofuscante que eclipsa
eclipsado! ofuscante! em seu interior há imagem
ofuscante! eclipsado! em seu interior há coisa
isolado! abscôndito! em seu interior há essência
essa essência... pura verdade
em seu interior há fidelidade
da antiguidade até o presente
seu nome não muda
e assim examina o surgir de tudo
como sei a forma de tudo surgir ?
pelo aqui
curvando então fica inteiro
retorcendo então fica direito
esvaziando então fica pleno
desgastando então fica novo
sendo pouco então é obtido
sendo demais então é perturbador
assim
o homem santo abraçando o uno
torna-se modelo sob o céu
não se exibindo então brilha
não se afirmando então figura
não se vangloriando então tem mérito
não se enaltecendo então perdura
só por não disputar
sob o céu ninguém pode com ele disputar
o adágio antigo: "curvando então fica inteiro"
como pode ser palavra vazia?
em verdade integra nele reintegrando
falar diluído é o natural
portanto
um vendaval não dura uma manhã
um temporal não dura um dia
quem os fomenta ?
céu e terra
céu e terra . . sua fúria não dura
quanto mais a intempérie humana!
portanto
quem segue o curso une-se ao curso
quem segue a virtude une-se à virtude
quem segue a perdição une-se à perdiçao
quem se une ao curso este o acolhe com alegria
quem se une à virtude esta o acolhe com alegria
quem se une à perdição esta o acolhe com alegria
pouca fé não merece fé
Na ponta dos pés não se firma
escarranchado não se anda
quem se exibe não brilha
quem se afirma não figura
quem se vangloria não tem mérito
quem se enaltece não perdura
isto em relação ao curso soa:
superfluidade parasitismo
coisas que todos abominam
portanto
quem no curso nelas não incorre
Há algo indefinido porém perfeito
antes de nascerem céu e terra
Silente! apartado!
fica só não muda
tudo pervade nada periga
pode ser considerado a mãe sob o céu
eu não sei seu nome
dou-lhe a grafia: (Dao)
forçado a nomeá-lo digo: grande
grande soa: além
além soa: longínquo
longínquo soa: retornante
portanto
o curso é grande
o céu é grande
a terra é grande
o mediador é grande
no universo há quatro grandes
o mediador é um dos quatro
o homem segue a terra
a terra segue o céu
o céu segue o curso
o curso segue a si mesmo
o pesado é raiz do ligeiro
o repouso é senhor do agitado
por isso o homem santo
na jornada não larga o peso da bagagem
embora tenha visões magníficas fica calmo e distante
que fazer?
é senhor de dez mil carros
e por ele desleixa o império?
sendo ligeiro então perde a raiz
sendo agitado então perde a soberania
bom caminhar não deixa vestígio
boa fala não têm jaças a aquilatar
boa computação não usa talhas nem fichas
bom fecho não usa trancas e não se abre
boa ligação não tem cordas e não se solta
por isso o homem santo
bom sempre em salvar homens
portanto não há homens rejeitados
bom sempre em salvar coisas
portanto não há coisas rejeitadas
isto se diz: adentrar o alumbramento
portanto
o homem bom é modelo para o não-bom
o homem não-bom é potencial para o bom
sem apreciar o modelo e cuidar do potencial
mesmo a sabedoria será grande extravio
isto se diz: essencial ao deslumbramento
conhecer o masculino conservar o feminino
é tornar-se álveo do mundo
tornando-se o álveo do mundo
a virtude eterna não escorre
e volta a ser recém-nascido
conhecer o claro conservar o escuro
tornar-se o ideal do mundo
tornando-se ideal do mundo
a virtude eterna não flutua
e volta a ser não-dual
conhecer o glorioso conservar o vergonhoso
tornar-se o vale do mundo
tornando-se o vale do mundo
a virtude eterna é suficiente
e retorna a ser lenho tosco
decomposto o lenho-tosco
eis compostas as funções
o homem santo usando-o
torna-se dirigente do funcionalismo
portanto
a grande regência não faz cortes
querer abarcar o mundo e nele atuar
eu vejo não ser alcançável...
o mundo é um vaso espiritual
não é possível nele atuar
o atuante arruína-o
o abarcador perde-o
portanto
as coisas ora precedem ora seguem
ora amainam ora enfurecem
ora prosperam ora declinam
ora afluem ora refluem
por isso
o homem santo afasta o demasiado
o desmesurado
o desqualificado
os que ajudam o soberano pelo curso
esses não violam com armas o mundo
tal ação provoca reação
onde campeiam tropas aí crescem espinhos
após grandes combates sempre anos nefastos
bom é apenas o desfecho
e basta!
não ousar dominar com violência
o desfecho sem apoteose
o desfecho sem repressão
o desfecho sem arrogância
o desfecho porque irremediável
o desfecho sem violência
as coisas reforçando-se caducam
isto se diz: sem curso
sem curso logo o decurso
eis que belas armas não são instrumentos auspiciosos
são coisas que todos abominam
portanto
quem no curso delas não se ocupa
o nobre em casa honra a esquerda
no uso de armas honra a direita
armas não são instrumentos auspiciosos
não são instrumentos do nobre
se inelutável usa-as
pondo calma e moderação acima
vence sem embelezar a vitoria
quem faz isso exulta em matar pessoas
esse não pode obter seus intentos no mundo
nos eventos benéficos prefere-se a esquerda
nos eventos maléficos prefere-se a direita
o general da reserva fica à esquerda
o general do comando fica à direita
a dizer que observa o rito fúnebre
massacres são pranteados com ais e lamentos
na vitoria militar observa-se o rito fúnebre
curso... lenho-tosco sempre sem nome
embora pequeno pequeno o mundo porém não o pode sujeitar
principes e reis podendo preserva-lo
as dez mil coisas por si se subordinam
céu e terra em conúbio rorejam doce orvalho
o povo sem ser ordenado por si se coordena
feito o corte logo surgem os nomes
já havendo os nomes aí deve-se saber parar
sabendo parar nada periclita
um símile do curso no mundo:
o arroio e vale indo para o rio e mar
quem conhece o outro é sábio
quem conhece a sí mesmo é iluminado
quem vence o outro tem força
quem vence a si é forte
quem se contenta é rico
quem se força a andar tem querer
quem não perde seu lugar perdura
quem morre sem se anular tem a vida
o grande curso é transbordante
ele pode à esquerda e à direita
as dez mil coisas dele dependem para viver
nunca são rejeitadas
completa a obra e não se apropria
veste e nutre as dez mil coisas e não se faz senhor
pode ser nomeado no que é pequeno
as dez mil coisas a ele retornam e não se faz senhor
pode ser nomeado como grande
e só por não se fazer grande
pode realizar sua grandeza
retendo a grande imagem
o mundo acorre
acorre sem prejudicar
assim a grande paz
música e atrativos...
para o hóspede de passagem
o que vai da boca do curso...
tão diluído que a nada sabe!
olhá-lo não basta para o ver
ouví-lo não basta para o escutar
usá-lo não basta para o esgotar
quer-se a contração
é preciso consolidar a expansão
quer-se o enfraquecimento:
é preciso consolidar o fortalecimento
quer-se a decadência:
é preciso consolidar o florescimento
quer-se a privação:
é preciso consolidar a doação
isto se diz: iluminação sutil
suavidade vence violência
não deve o peixe sair das profundezas
nem a potestade do reino a outros mostrar-se
o curso sempre não atuando
e nada fica por atuar
príncipes e reis podendo preservá-lo
as dez mil coisas por si se transformam
transformadas e surgindo o desejo
eu o reprimo pelo lenho sem nome
no lenho-tosco sem nome
eis que de fato não há desejo
sem desejo fica-se em repouso
o mundo por si se fixa
a virtude superior não ostenta virtude
por isso tem virtude
a virtude inferior não se despe de virtude
por isso não tem virtude
a virtude superior não atua não ficando por atuar
a virtude inferior não atua ficando por atuar
o amor-humano superior atua não por ter de atuar
a justiça superior atua por ter de atuar
o rito superior atua ninguém corresponde
aí arregaça as mangas indo às vias de fato
portanto
perdido o curso eis a virtude
perdida a virtude eis o amor-humano
perdido o amor-humano eis a justiça
perdida a justiça eis o rito
ora o rito dilui fé e fidelidade
sendo pois cabeça de toda desordem
o saber prematuro é mera flor do curso
sendo pois princípio de todo desatino
por isso
o homem em plena maturidade...
ocupa-se do denso e não do diluído
ocupa-se do real e não da florescência
portanto
afasta o ali agarra o aqui
eis a unificação dos primórdios
o céu uno ficou claro
a terra unificada ficou tranquila
o espírito uno ficou animado
o vale uno ficou repleno
as dez mil coisas unificadas ficaram geradoras
príncipes e reis unos ficaram fidedignos
isso conseguiu-se pela unificação
o céu não claro talvez rachasse
a terra não tranquila talvez implodisse
o espírito não animado talvez sucumbisse
o vale não repleno talvez arruinasse
as dez mil coisas não geradoras talvez ruíssem
príncipes e reis não fidedígnos talvez tombassem
portanto
o dígno tem suas raizes no humilde
o alto tem suas bases no baixo
por isso
príncipes e reis se intitulam:
orfãos viúvos indigentes
será por suas raízes no humilde ? não ?
portanto
a glória suprema não se vangloria
não esmerar como jade mas rusticar como pedra
continua
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