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Internet e Pornografia

 

Carlos Alberto Di Franco
(Professor de Ética Jornalística do Master
em Jornalismo para Editores)

 

A Internet está facilitando a divulgação da pornografia infantil no País. Apesar de proibidas pela legislação brasileira - de acordo com o artigo 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente, é crime "fotografar ou publicar cena de sexo explícito ou pornografia envolvendo criança ou adolescente"-, imagens de crianças na faixa de 3 a 11 anos envolvidas em cenas de sexo explícito podem ser encontradas na rede. Existem pessoas e empresas que colocam à disposição do público arquivos com fotos pornográficas. Depois de localizadas, elas passam a circular entre usuários da rede e até em locais que poderiam ser considerados públicos - como as salas de bate-papo com imagens. A crescente presença da pornografia infantil na Internet, revelada em matéria publicada pelo Estado, chocou a opinião pública.

Ouvido pela reportagem, o procurador de Justiça Paulo Afonso Garrido, coordenador do Centro Operacional das Promotorias da Infância e da Juventude, surpreendeu-se com a perversa tranqülidade com que o crime trafega no ciberespaço. No próprio microcomputador do Ministério Público, a repórter acessou várias páginas eletrônicas, editadas em diferentes locais do Brasil. Quando as imagens surgiram na tela, o procurador espantou-se. É estarrecedor, reagiu. O aparecimento da pornografia infantil na Internet, reacendeu o debate a respeito do estabelecimento de mecanismos técnicos, éticos e jurídicos eficazes no combate à delinqüência eletrônica.

O problema, independentemente da indignação provocada por algumas páginas pornográficas, não é de fácil solução. Envolve inúmeras dificuldades de caráter político e operacional. Eventuais controles esbarram com uma dificuldade concreta: o caráter mundial da Internet relativiza e enfraquece o poder coercitivo das legislações nacionais. Um mundo que não é capaz de estabelecer uma política unitária no combate às drogas, dificilmente conseguirá desenhar uma plataforma comum na guerra à pornografia. A decisão da Corte Suprema dos Estados Unidos, que rejeitou o projeto que previa prisão por dois anos e multa de até 250.000 dólares, para quem colocasse na rede material considerado indecente, foi um banho de água fria nas tentativas de regulamentação jurídica. Com a derrota do presidente Bill Clinton, que defendia a censura na Internet, os esforços nacionais não passarão de um jogo de faz-de-conta.

Na verdade, medidas preventivas são praticamente inexeqüíveis. Segundo especialistas no assunto, policiar um sistema tão vasto e com tantos recursos técnicos seria uma tarefa extremamente cara e de resultado incerto. Embora seja possível bloquear o acesso aos sites publicamente conhecidos como pornográficos, os programas de filtro de conteúdo, freqüentemente apresentados como alternativa para impedir o acesso às páginas inconvenientes, são de eficácia duvidosa. As páginas contendo pornografia infantil vivem à sombra da clandestinidade. Tratando-se de atividade claramente criminosa não estão presentes nos catálogos de endereços. Como os filtros costumam apoiar-se em palavras-chave como sexo, acabam não só impossibilitando o ingresso em endereços pornográficos, mas também em páginas científicas, educativas, etc. Paradoxalmente, conteúdos moralmente corrosivos, mas redigidos com o cuidado de evitar as palavras "proibidas", seriam exibidos. O bloqueio de fotos (ou imagens) é tecnicamente ainda mais complicado. Afinal, precisar automaticamente o conteúdo de uma imagem.é o principal problema da área de pesquisa conhecida como "visão computacional".

Algumas medidas, no entanto, podem ser adotadas. Quando identificados, os responsáveis pela divulgação de pornografia infantil, racismo ou incitamento ao ódio, devem ser rigorosamente punidos. A censura prévia, indesejável e tecnicamente inviável, não elimina o necessário enquadramento do criminoso comprovado. Pode-se, também, estimular mecanismos de auto-regulamentação. Associações de provedores, à semelhança do que ocorre na área de publicidade, com o Conar, poderiam definir um código de ética, conferir selos de qualidade para quem assumisse o compromisso de não difundir material imoral ou anti-social, publicar listas negras com nomes dos indesejáveis do ciberespaço, etc.

Os problemas levantados pelo mau uso da Internet, são infinitamente menores que os benefícios trazidos por esse fascinante canal de aproximação dos povos, de democratização dos conhecimentos e de globalização da solidariedade. Seus desvios não serão resolvidos por meio de tutelas governamentais. Na verdade, a Internet salienta uma nova realidade: chegou para todos, sobretudo para a família, a hora da liberdade e da responsabilidade. Se a família não cumprir o seu papel, não será o paternalismo do governo que preencherá esse espaço com a devida competência. Não há regulamento capaz de suprir a ausência da família. A educação para o exercício da liberdade é o grande desafio dos nossos dias. Como salientou matéria do The Economist, "ao atingir tantas pessoas, com tanta facilidade, a Internet pode resultar, ironicamente, em que as pessoas precisem menos dos governos, à medida que coloca a tecnologia nas mãos de quem a quiser. Os crivos contra a pornografia não são perfeitos, mas são menos permeáveis do que os toscos instrumentos brandidos pelos censores do governo". A aventura da liberdade, desguarnecida de ilusórias intervenções do Estado, acabará gerando uma sociedade mais consciente e amadurecida.